Polícia Federal pediu a prisão temporária da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em inquérito que apura se a JBS fez, a pedido do PT, doações ilícitas de R$ 40 milhões a aliados dela nas eleições de 2014. A medida, no entanto, foi negada pelo ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal).
A informação consta de representação enviada à corte, em 26 de junho, pelo delegado Bernardo Guidali Amaral. Ele também requereu as prisões temporárias (de cinco dias, renováveis) do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, do ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Vital do Rêgo, dos ex-senadores Eunício Oliveira (MDB-CE) e Valdir Raupp (MDB-RO), e mais cinco pessoas.

O delegado justificou haver "alta probabilidade" de os investigados, "caso mantidos em liberdade", interferirem na coleta de provas.
Contudo, o vice-procurador-geral da República, José Bonifácio Borges de Andrada, discordou das medidas.
Em seu parecer sobre o caso, justificou que "não há evidências" de que os investigados "possam atrapalhar a execução das medidas de busca e apreensão".
Em sua decisão, de 21 de outubro, Fachin afirmou que, embora "esteja satisfatoriamente demonstrada a plausibilidade das hipóteses investigativas levadas a efeito pela autoridade policial, a pretensão de restrição da liberdade de locomoção dos investigados não se encontra provida da indicação de concretas condutas atentatórias às apurações que evidenciem a necessidade da medida extrema".
Em nota, Dilma classificou o pedido de prisão de estarrecedor e sustentou que o ministro da Justiça, Sergio Moro, cuja pasta é responsável pela PF, se esforça para perseguir adversários.
Fachin autorizou, contudo, que a ex-presidente e demais investigados fossem intimados a depor, entre eles os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (MDB-AM), líder do partido, e o ministro Vital do Rêgo.
As notificações foram feitas nesta terça-feira (5), durante operação que também cumpriu mandados de busca e apreensão.
O objetivo da PF é investigar suposto esquema de corrupção e lavagem de dinheiro para o financiamento de campanhas em 2014.
Segundo o inquérito sobre o caso, a JBS disponibilizou para o PT duas contas no exterior, totalizando US$ 150 milhões, cujos recursos foram usados para bancar campanhas em 2014, ano em que Dilma disputou, com sucesso, a reeleição.
As apurações se baseiam nas delações premiadas de executivos da J&F, holding que controla a JBS, do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e do ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil), entre outros.
Ex-diretor de Relações Institucionais da JBS, Ricardo Saud disse ter providenciado o pagamento de R$ 40 milhões a senadores do MDB, a pedido de Mantega.
O objetivo dos pagamentos, segundo o delator, seria comprar o apoio dos congressistas e evitar que eles aderissem à candidatura do rival da petista na disputa, o então senador Aécio Neves (PSDB-MG), hoje deputado federal.
Renan, por exemplo, teria recebido R$ 11,9 milhões, destinando parte da quantia à coligação do governador de Alagoas, Renan Filho (MDB); Braga e Vital, R$ 6 milhões cada.
Também são investigados o senador Jader Barbalho (MDB-PA) e o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), supostos beneficiários de R$ 8,9 milhões;
Outros alvos das apurações são Eunício e Raupp, que teriam obtido R$ 6 milhões e R$ 2 milhões, respectivamente.
Saud também relatou que, ao saber das tratativas com senadores de seu partido, o então vice-presidente Michel Temer (MDB) fez uma reclamação e recebeu R$ 15 milhões.
As informações sobre esses repasses vieram à tona com a divulgação, em 2017, das delações da JBS. Os citados negam envolvimento em ilicitudes.
O dinheiro, segundo Saud, foi repassado por meio da simulação da prestação de serviços, com a emissão de notas fiscais frias, entregas de dinheiro em espécie e doações oficiais.
Fachin indeferiu buscas nos endereços dos políticos investigados, mas as autorizou em relação a 25 empresas e pessoas físicas que teriam tido alguma função nos processos de pagamento e ocultação de valores.
Um desses mandados foi contra o Ibope. Segundo a investigação, em julho de 2014, a J&F pagou por uma pesquisa eleitoral à empresa, mas o beneficiário desse trabalho seria Renan.
"A documentação apresentada pelo Ibope confirma que a prestação de serviços no campo da pesquisa eleitoral ocorreu em benefício do senador, e não ao Grupo J&F, como constou na nota fiscal, datada de 14 de julho de 2014, emitida pela empresa para a J&F Investimentos", diz trecho da decisão de Fachin.
Em depoimento à PF, Palocci afirmou que o empresário Joesley Batista, dono da JBS, lhe disse ter estranhado o pedido de Mantega para fazer pagamentos a integrantes do MDB e que procurou Dilma a respeito.
"Joesley relatou que a presidente Dilma disse a seguinte frase: 'é para fazer'", contou Palocci, segundo a transcrição de seu depoimento, feita pela PF.
Em nota, a assessoria de Dilma afirmou ser estarrecedora a notícia de que a PF pediu sua prisão "num processo no qual não é investigada e nunca foi chamada a prestar qualquer esclarecimento".
"A ex-presidenta sempre colaborou com investigações e jamais se negou a prestar testemunho perante a Justiça Federal, nos casos em que foi instada a se manifestar."
A nota diz que nesta terça Dilma "foi convidada a prestar esclarecimentos à Justiça". "No final da tarde, soube pela imprensa do pedido de prisão."
"O pedido de prisão é um absurdo diante do fato de não ser ela mesma investigada no inquérito em questão. E autoriza suposições várias, entre elas que se trata de uma oportuna cortina de fumaça. E também revela o esforço inconsequente do ministro da Justiça, Sergio Moro no afã de perseguir adversários políticos. Sobretudo, torna visível e palpável o abuso de autoridade, continua o comunicado.
O Ibope, em nota, confirmou que a PF esteve em seus escritórios. "Foram entregues os mesmos arquivos e documentos que entregamos ao Ministério Público em 2017, quando houve a delação da JBS. Nada além disso", diz o texto.
A assessoria do senador Renan Calheiros afirmou que, às 7h32 desta terça, ele recebeu um delegado da PF em sua residência para entregar intimação de depoimento.
"O senador afirmou que está à disposição e que é o maior interessado no esclarecimento dos fatos", diz a nota de Renan.
Os advogados de Eduardo Braga divulgaram nota afirmando que ele recebeu nesta manhã uma solicitação do delegado Bernardo Amaral para prestar esclarecimentos no mesmo inquérito.
"O senador sempre se colocou à disposição para colaborar com qualquer investigação. A cobertura midiática de hoje, talvez por sensacionalismo, talvez por desinformação, menciona fato que simplesmente não existiu, na medida em que nenhuma medida de busca e apreensão foi realizada na residência ou em qualquer outro endereço do senador Eduardo Braga", diz a nota.
Mais tarde, Braga foi ao Palácio do Planalto, onde concedeu uma entrevista.
"Eu recebi um agendamento de oitiva. E, como sempre, presto todos os esclarecimentos e apoio toda e qualquer operação. Agora, o que não é justo é fake news dizer que imóveis e gabinete tenham sofrido busca e apreensão. Eu não sofri busca e apreensão", disse.
O senador disse ainda que marcará uma data para esclarecer a questão e ressaltou que não tem "nenhuma relação com nenhuma consultoria de nenhuma ordem ou natureza".
Vital, também por escrito, informou que houve uma solicitação para depoimento, "o que não configura nenhuma medida extravagante ou derivada do que alguns setores costumam chamar de 'operação', apenas para impressionar a opinião pública".
"O ministro é o maior interessado em esclarecer os fatos e, portanto, atenderá a solicitação do depoimento, colaborando com a justiça, como sempre tem feito", diz a nota.
A defesa de Raupp disse em nota que ele prestou depoimento e informou não ter sido candidato em 2014, tampouco presidente de diretórios de seu partido.